Após Previdência, governo planeja enviar medidas econômicas ao Congresso; saiba quais são

A área econômica do governo Bolsonaro, chefiada pelo ministro Paulo Guedes, já tem praticamente fechado um amplo pacote de medidas para propor ao Congresso Nacional após a conclusão da reforma da Previdência. A intenção é apresentar o plano como uma agenda de “transformação” do Estado.

De acordo com interlocutores da equipe econômica, as propostas têm sido debatidas internamente nos últimos meses e só não foram apresentadas ainda para evitar ruídos no Legislativo e afastar problemas na aprovação da reforma da Previdência, considerada prioridade e cuja tramitação deve ser concluída nesta semana.

O pacote econômico vai prever ações com o objetivo de melhorar as contas do governo, dos estados e municípios, simplificar procedimentos e estimular o crescimento da economia, visando a geração de empregos. Várias das medidas já foram comentadas por autoridades do Ministério da Economia nos últimos meses.

O plano contempla quatro eixos básicos:

mudanças no chamado pacto federativo (regras sobre arrecadação, os campos de atuação dos estados e municípios e suas obrigações);

reforma administrativa (alteração de regras para o serviço público);

reforma tributária (mudanças nos tributos cobrados da sociedade);

aceleração do processo de privatizações (vendas de empresas públicas).

As linhas gerais da proposta

MUDANÇAS NO PACTO FEDERATIVO

Considerado pela área econômica como o principal eixo do pretendido processo de transformação da economia, as mudanças no pacto federativo – conjunto de regras constitucionais que determina a arrecadação de recursos, os campos de atuação dos estados e municípios e suas obrigações para com os contribuintes – englobarão uma série de propostas.

Segundo informações iniciais do Ministério da Economia, com as mudanças no pacto federativo, a previsão é de um aumento de transferências de recursos aos estados e municípios, de cerca de R$ 500 bilhões em 10 anos. Mas esse valor pode cair devido à “desidratação” da proposta de reforma da Previdência.

Apesar de destinar mais recursos aos estados e municípios, a proposta da área econômica é de que sejam vedados gastos adicionais desses entes em pessoal e custeio – de modo que as transferências adicionais feitas pelo governo sejam utilizadas para investimentos e redução de dívidas.

Conheça os principais pontos das propostas de mudança no pacto federativo:

Divisão dos recursos do petróleo – junto com a divisão dos recursos do megaleilão de petróleo da cessão onerosa, o ministro Paulo Guedes já informou que o governo quer aumentar a destinação de recursos do pré-sal aos estados e municípios.

Fundeb – Governo deve propor a manutenção do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), com aumento proposto no repasse da União de 10% para 15%, que seria feito por meio de recursos existentes nos fundos constitucionais. O valor proposto, porém, ficará abaixo da proposta da deputada Dorinha Rezende (DEM-TO) que torna o Fundeb permanente – pela qual a União teria que arcar com a alta dos repasses para 40%.

Descentralizar, desvincular e desindexar (DDD) – Além da descentralização de recursos (destinação maior de verbas do petróleo e do Fundeb para os estados e municípios), o plano do ministro Paulo Guedes prevê ainda a desindexação do orçamento (que as despesas deixem de crescer, na medida do possível, de acordo com indexadores) e a desvinculação de recursos (desobrigação de gastos em determinadas áreas). O plano ficou conhecido como “DDD”. “Somos geridos hoje por um ‘software’ [que controla a destinação dos recursos], programa que manda o dinheiro sair, em determinada proporção, e 96% está carimbado. Há uma inversão de valores. Em uma democracia madura, o Congresso assume os orçamentos públicos. O Congresso tem de assumir o controle orçamentário da República”, explicou o ministro Guedes em setembro.

Reforço de gatilhos das regras fiscais – A regra do teto de gastos públicos (pelo qual as despesas não podem crescer acima da inflação do ano anterior) já prevê, no caso de seu descumprimento, uma série de “gatilhos” que seriam acionados como, por exemplo, a proibição para novos concursos, de reajustes aos servidores e de aumentos de gastos com subsídios.

O problema é que o governo já vem adotando essas diretrizes nos últimos anos, mesmo sem o descumprimento do teto de gastos. Por isso, o plano, que deve prever o “reforço” desses gatilhos, tem como base propostas da PEC do deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), relacionadas com a regra de ouro. De acordo com o Ministério da Economia, o governo analisa apoiar a interrupção do pagamento do abono salarial caso os limites sejam descumpridos e a redução temporária da jornada de trabalho de servidores, com redução salarial equivalente. Também avalia propor o corte de todas as remunerações acima do teto do Supremo Tribunal Federal (STF).

Conselho Fiscal da República – Governo vai propor a criação desse conselho, que vai reunir integrantes da área econômica, do Congresso Nacional, do Judiciário e dos estados. O presidente Jair Bolsonaro também poderá participar dos encontros. A ideia, segundo disse Guedes recentemente, é que o conselho analise a cada três meses a destinação dos recursos públicos.

O conselho está sendo apelidado de “Copom das contas públicas”. O Copom é o órgão do Banco Central que define os juros básicos da economia, com base nas metas de inflação. Já o Conselho Fiscal da República acompanhará a execução dos gastos públicos e o cumprimento das regras fiscais.

Atualmente, há três normas fiscais a serem cumpridas: o teto de gastos (despesas não podem subir acima da inflação do ano anterior); a meta de déficit primário (despesas maiores do que receitas, sem contar juros da dívida) e a chamada regra de ouro (que impede que o governo contraia dívida para cobrir despesas correntes, como o pagamento de salário de servidores). A área econômica defende a manutenção das duas primeiras, mas negocia alterações na regra de ouro.

REFORMA ADMINISTRATIVA

A área econômica informou que o governo está fazendo, nos últimos meses, um “grande diagnóstico” do serviço público e que conversa com especialistas, além de órgãos internacionais, comO o Banco Mundial e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), para definir as bases de uma proposta de reforma administrativa a ser enviada ao Legislativo.

De acordo com as projeções contidas na proposta da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2020, os gastos com servidores públicos – a segunda maior despesa primária do orçamento (perdendo apenas para a previdência social) – avançariam de R$ 326 bilhões, em 2019 (4,46% do Produto Interno Bruto – PIB), para R$ 338,1 bilhões em 2020 (4,29% do PIB); para R$ 350 bilhões em 2021 (4,14% do PIB); e para R$ 363,3 bilhões (4% do PIB) em 2022.

O impacto da reforma administrativa nas contas públicas, segundo a última previsão do Ministério da Economia, deve começar em 2021.

Regime jurídico para novas contratações de servidores – O governo avalia flexibilizar as regras de contratação de novos servidores públicos. Está em estudo, por exemplo, a contratação de celetistas e de funcionários temporários, que não teriam estabilidade no cargo, via concurso público. Atualmente, os servidores públicos estatutários da administração direta, de autarquias ou de fundações públicas têm direito à estabilidade após três anos de efetivo exercício, desde que aprovados em avaliação especial de desempenho. Isso vale para todos os poderes da União, de estados, do Distrito Federal e dos municípios. Quem faz concurso para empresas públicas e sociedades de economia mista é chamado de empregado público e está submetido ao regime jurídico estabelecido pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Salário – Nas novas contratações, o objetivo é aproximar o salário inicial da “realidade do mercado”, o seja, do setor privado. Estudo do Banco Mundial diz que o setor público federal paga, em média, salários 96% superiores aos pagos pelo setor privado formal. O levantamento foi feito com base em dados de 2017.

Progressão de carreira – Atualmente, há uma tabela de progressão salarial com 13 níveis. A intenção do governo é que a progressão tenha mais níveis, de modo que os servidores demorem mais tempo para chegar ao salário final da carreira.

Número de carreiras – Atualmente, há mais de 300 tipos de carreiras no serviço público. A proposta é reduzir para algo entre 20 ou 30 carreiras. Segundo o governo, isso vai racionalizar o sistema e permitir uma maior “mobilidade” para os servidores.

Avaliação de servidores – O governo quer aprimorar o sistema de avaliação de servidores públicos. “Estamos vendo as melhores práticas internacionais para criar um mecanismo onde o servidor se sinta engajado, tenha reconhecimento. No futuro, a gente quer um mecanismo onde a atuação do servidor tenha um peso muito importante para o seu crescimento”, disse o secretário especial de Desburocratização do Ministério da Economia, Paulo Uebel, em agosto.

G1