Vereadores criticam prefeitura por impedir distribuição de alimentos a moradores de rua

A vereadora Sandra Marrocos (PSB) usou a tribuna da Câmara Municipal de João Pessoa (CMJP), nesta terça-feira (5), para destacar um ‘Voto de Solidariedade’, aprovado unanimemente pela Casa, à Pastoral da Igreja das Neves. De acordo com a parlamentar, os membro da Pastoral, que fazem distribuição de alimentos para moradores de rua pelo centro da capital paraibana, foram impedidos de realizar o ato solidário, de forma truculenta, por órgãos da Prefeitura de João Pessoa (PMJP).

“Participei da Pastoral da Perseverança e sei o que fazem as pessoas que transformam suas vidas em um canal de solidariedade, dispondo do seu tempo para ajudar as pessoas que precisam. É o que faz Zill Bezerra, responsável pelo Encontro de Casais com Cristo (ECC), da Pastoral da Igreja das Neves, que tem um trabalho de distribuição de alimentos em vários pontos da nossa cidade, inclusive na Praça João Pessoa, e que ontem (segunda-feira, 4) teve seu ato solidário impedido de ser realizado, de forma truculenta, pela gestão municipal da nossa cidade”, destacou a vereadora.

Sandra Marrocos informou ainda que Aline Araújo, membro de um grupo que também realiza ações de solidariedade no Centro da capital, avisou que o Projeto Social Vagalumes – cujos integrantes utilizam as artes do circo, da música, do teatro e da poesia em suas atividades, além da distribuição de alimentos – e o Projeto Noite da Ternura – que distribui quentinhas aos moradores de rua da cidade – não vão realizar as ações da semana por receio de represálias.

“A prefeithura, além de não fazer, está impedindo que se realize em nossa cidade esse ato de humanidade. Zill chorou ao telefone falando comigo hoje, relatando que foram tratados como marginais por servidores das Secretarias de Desenvolvimento Urbano (Sedurb), Desenvolvimento Social (Sedes) e a Guarda Municipal (GM). A ação não aconteceu de forma respeitosa”, ressaltou a vereadora.

Sandra Marrocos destacou que os gestores propuseram uma reunião para discutir uma parceria entre eles, para que a distribuição de alimentos seja realizada via Restaurante Popular. “A Pastoral não é uma ONG, é um projeto social. Não dá para impedir a distribuição de alimentos e sugerir que se faça essa distribuição através de um trabalho social que deve ser prestado pela prefeitura. Estão querendo é higienizar o Centro da cidade como fizeram no Porto do Capim”, alegou.

A parlamentar também enfatizou que as pessoas em situação de rua da cidade precisam de ações sociais que lhes permitam voltar a ter esperança de inclusão e de libertação das drogas, vícios que muitos adquirem ao chegar em tal situação. “Não se pode criminalizar a pobreza, nem empurrar para debaixo do tapete, com truculência, as mazelas da cidade. Existia uma ‘Casa de Acolhida’ na cidade, que foi fechada. Essas pessoas da Pastoral fazem um trabalho de solidariedade com quem, muitas vezes, não têm nada para comer durante o dia, sendo essa sua única refeição”, refletiu.

A vereadora ainda informou que tramita na CMJP o Projeto de Lei 788/2018, de autoria do vereador Marcos Vinícius (PSDB), preconizando que o poder público municipal deve manter na cidade de João Pessoa serviços e programas de atenção à população em situação de rua, garantindo padrões éticos de dignidade e não violência na concretização de mínimos sociais e dos direitos de cidadania a esse segmento.

Em apartes, os vereadores Marcos Henriques (PT), Eliza Virgínia (PP) e Sérgio da SAC (Solidariedade) corroboraram com as palavras de Sandra Marrocos e destacaram a importância dessas ações solidárias para transmitir esperança às pessoas em situação de rua. “Precisamos conversar sobre essa questão, mas não se pode impedir a realização desse ato de amor’, comentou Eliza Virgínia.

Atuação de grupos

O vereador Carlão (DC) defendeu a atuação de grupos, religiosos ou não, que distribuem refeições e proporcionam momentos de higiene pessoal para pessoas em situação de rua. Segundo o parlamentar, são esses grupos que, muitas vezes, evitam que essas pessoas morram de fome.

O parlamentar explicou que o termo “insegurança alimentar” se refere à incerteza quanto ao acesso a alimentos no futuro, e que esses grupos promovem uma segurança alimentar, que muitas vezes representa a única fonte de alimentação para pessoas em situação de rua. “A pessoa que come hoje não sabe se come amanhã. Se as pessoas não morrem de fome, é porque existem grupos de voluntários voltados a afastar o terror da nação [fome], a dar o mínimo de esperança a pessoas em situação de rua”, afirmou o vereador, citando grupos como Consolação Misericordiosa, Casa da Paz e Irmãos de Fé.

“Nenhuma razão será considerada plausível quando a fome está inserida nesse processo. O fato que aconteceu ontem, por mais que seja para proteger outros valores, não tem justificativa. Existem várias instituições, comunidades religiosas e amigos que se reúnem para fazer o bem e sustentar um estado insuficiente, que nunca chega aos que mais precisam. A fome não espera a solução de problemas políticos e estruturais ou resoluções de poderes. A fome simplesmente não espera”, argumentou, pedindo o adiantamento da reunião para tratar do assunto, marcada para sexta-feira (8).

De acordo com o parlamentar, a informação da coordenação do Centro de Referência Especial da Assistência Social (Centro Pop) é que a problemática de pessoas em situação de rua é mais complexa, vai além da fome, abarcando dependentes químicos e pessoas com problemas de saúde mental, que vivem nas ruas.

“Se a prefeitura quer catalogar, compreender e entender a situação de dependentes químicos e pessoas com depressão que vivem nas ruas, tudo bem. Mas a gente não pode esquecer jamais que essas pessoas também passam fome, precisam ser acolhidas naquele instante. Não existe lei de assistência social capaz de alcançar o esforço que esses grupos fazem dando alimento, higiene e dignidade a essas pessoas”, afirmou.

A vereadora Sandra Marrocos e o vereador Marcos Henriques (PT) concordaram, em parte, com o discurso de Carlão, no sentido de que é preciso dialogar com esses grupos humanitários, além de promover políticas públicas para pessoas em situação de rua. “Quero dialogar com as pessoas que promovem esse trabalho humanitário. Pessoas em situação de rua merecem respeito, cuidado e políticas públicas, seja em segurança alimentar ou saúde. Por mais que as pessoas sejam generosas, elas não têm capacidade de assumir um caráter de política pública”, opinou Sandra Marrocos.

A vereadora Eliza Virgínia leu nota da prefeitura da capital afirmando que é a favor de ações que fortaleçam a segurança alimentar; que a restrição foi referente apenas à Praça João Pessoa, depois de recorrentes denúncias de vandalismo, tráfico de drogas e exploração sexual; e que, durante a operação realizada, foram encontradas armas brancas, objetos perfurantes e fogareiros que poderiam colocar em risco a integridade de quem circula na área, cuja revitalização foi realizada pela atual gestão.

Situação de rua

O vereador Bruno Farias (Cidadania) também prestou solidariedade ao grupo de voluntários da Pastoral da Paróquia de Nossa Senhora das Neves. Segundo o parlamentar, foi violenta e insensível a interrupção da ação filantrópica na Praça João Pessoa durante a noite da segunda-feira, por agentes da Secretaria do Desenvolvimento Urbano e Guarda Municipal.

Bruno Farias relembrou trechos da nota divulgada pela PMJP a respeito da intervenção, que recomendou parar a distribuição de alimentos. De acordo com o parlamentar, a nota não abordou que a suspensão do trabalho dos voluntários também ocorreu no Ponto de Cem Réis, no Centro da capital. Além disso, Bruno Farias alegou que o informe enquadraria facas e demais ferramentas utilizadas pelos voluntários como objetos desencadeadores de qualquer ato de delinquência.

“A prefeitura poderia ter chamado a Pastoral das Pessoas em Situação de Rua da Arquidiocese da Paraíba para falar da situação e combinar como seria realizado o trabalho. É preciso haver mais envolvimento. Pessoas saíram de casa, prepararam alimentos voluntariamente, foram às ruas ajudar cidadãos e foram surpreendidas com uma ação tão bruta. Minha solidariedade a todas as entidades que realizam esse tipo de trabalho. Meu repúdio pelo ato violento e pela nota insensível emitida pela prefeitura”, lamentou Bruno Farias.

Diário da Paraíba com Secom-PB

Contato com a Redação: [email protected]