Evelyn Bastos fala de reinado na Mangueira: ‘Represento todas as mulheres periféricas’

Muito mais do que sambar, para Evelyn Bastos, rainha de bateria da Mangueira desde 2014, o carnaval é um ato de resistência e manifestação cultural.

Politizada e ativista, a sambista posou com exclusividade para ensaio do G1 nas vielas do Morro da Mangueira, na Zona Norte do Rio, e falou sobre sua relação com o cargo que ocupa na escola.

“Estar hoje à frente da bateria, que é um lugar onde muitas pessoas conseguem me ouvir e me ver, me faz ter cada vez mais força para falar por todas as mulheres que também falam e não são ouvidas. Estou em um espaço que não represento só a mim, represento todas as mulheres periféricas. Então, se eu estou nesse lugar, não faço mais do que a minha obrigação por mim, por elas, pela minha irmã que tem 14 anos, e que vão tentar conquistar os seus espaços.”

Espaço esse que Evelyn usa para servir de inspiração para toda uma geração que a acompanha de perto em sua comunidade. As meninas que veem de perto o seu reinado. “Quero mostrar que elas não precisam de dinheiro nem estar na televisão para conquistar algo. É preciso ser o que cada uma é e despertar nelas esse sentimento”, diz ela, que desfila nas escola desde os seus 4 anos de idade.
Em 2019, no ano em que a Mangueira venceu o carnaval com o enredo “História para ninar gente grande”, Evelyn Bastos usou da sua fantasia para trajar o discurso político. Ela se caracterizou da escrava Esperança Garcia, primeira mulher advogada do Brasil. “Foi em um momento muito necessário. As pessoas de fora do carnaval passaram a me conhecer como uma ativista. A maioria das pessoas não sabia o que eu pensava. Mas, toda pessoa que nasce e cresce em uma favela carrega resistência no sobrenome.”

“Quebrar um tabu é muito difícil. Mas esse desafio me faz crescer a cada dia como mulher. É estar dentro de uma escola de samba, à frente de uma bateria, e despertar nas pessoas o pensamento de que não faz diferença a roupa que eu estou vestindo. E sim a minha essência, a mensagem que eu quero passar”, diz.

Para Evelyn, que tem 26 anos, é preciso urgência em rever a forma como o carnaval trata as mulheres. “Todas as pessoas deveriam reavaliar o olhar da mulher de carnaval ser tratada como um objeto. A gente é muito mais do que uma mulher que não sai da academia, não derrapa na dieta e não falha com a estética. Cada uma tem a sua história, tem a sua ligação com a comunidade. É preciso respeitar e não objetificar. O carnaval alimenta sonhos e não destrói”, analisa.

Já sobre uma necessidade de competição entre as rainhas de bateria, a representante da Mangueira é enfática. Seja no samba, no carisma ou na história: cada uma tem a sua individualidade e importância. “Cada uma tem sua característica e a dança da rainha de bateria carrega muito da história dela. Seja a sua ligação com o samba ou a sua espiritualidade. O samba é encanto, magia, um ritmo espiritual.
Então, cada uma vai estar ali de um jeito, do seu jeito. É isso que as pessoas precisam prestar atenção: na arte que cada uma carrega.”

Diário da Paraíba com G1