Os serviços de streaming e a pirataria
Com um movimento ousado no ano de 2007, uma empresa de entrega de DVD’s para residências nos Estados Unidos acabou se tornando uma das maiores potências mundiais, chegando em 2021 com lucro líquido avaliado em US$ 7,302 bilhões de dólares, segundo a empresa de serviços financeiros CMC Markets. A Netflix, que atua desde 1997, iniciou e popularizou uma prática que até então era incomum: a possibilidade de assistir a filmes e séries de forma on-line, com um preço reduzido e sem necessidade de devolução de DVD’s, CD’s, e VHS’s, como acontecia com as locadoras de filmes.
Apesar de inicialmente conter um catálogo de obras não muito extenso, devido a necessidade de criar parcerias com grandes estúdios para compra de obras originais, a empresa cresceu e hoje é referência em conteúdo on-line. Desde 2013, a pioneira do streaming iniciou a produção de conteúdos originais, concorrendo em premiações como Globo de Ouro e o Oscar.
Com o sucesso da Netflix, as empresas de TV a Cabo, as principais detentoras de produtos midiáticos do gênero até então, viram a oportunidade de possuir uma “Netflix” própria, tornando-se detentoras únicas dos lucros de seus conteúdos. Além disso, surgiram empresas com o objetivo de criar seus próprios serviços de venda e aluguel de filmes digitais personalizados, os serviços ondemand.
Em 2018, o canal por assinatura “Universal TV” realizou um estudo no Brasil apontando que cerca de 51% dos entrevistados costumam assistir a séries. Entre eles, pessoas de diferentes idades, gêneros, classes sociais e escolaridade. O meio social também se mostra influente na pesquisa, pois 60% dos entrevistados informaram ter assistido a algo por indicação de amigos ou familiares e não poderiam “ficar de fora” do assunto nas rodas de conversa.
Um serviço que facilita o acesso às mídias digitais, que aparentemente seria uma ótima ideia, tem um efeito colateral importante: o “bolso” dos clientes. Cada serviço de streaming possui um catálogo repleto de opções atraentes para cada tipo de público, mas não impede de uma pessoa ter vontade de ter mais de uma opção para “o sábado à noite”, parafraseando a música do cantor Lulu Santos. A partir disso, a assinatura de mais de um serviço de streaming, principalmente em um momento onde a economia mundial se encontra na pior recessão desde a Segunda Guerra Mundial, segundo comunicado do Banco Mundial, pode não ser uma opção para grande parte do público. Alguns destes, então, acabam se voltando para a pirataria, como afirma o mestre em Relações Públicas Gavin Nugent.
Se, antes da internet, eram comuns os DVD’s ou CD’s piratas, copiados e vendidos em feiras ao ar livre, por exemplo, essa prática, agora, tornou-se virtual. A era da informação traz a praticidade do download de arquivos quase que em tempo real, como episódios de séries e filmes, documentários etc.
Em outro estudo realizado também em 2018, a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), órgão do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), informou que o prejuízo dos canais de TV por assinatura chegava à média de R$ 10 bilhões de reais por ano. Porém, acredita-se que a dimensão do prejuízo sobre os serviços e o governo, através dos impostos, seja maior, devido à dificuldade de rastreamento da prática ilegal.
Segundo dados da companhia inglesa SimilarWeb, entre os dois primeiros meses da pandemia do Covid-19no ano de 2020, o tráfego de sites de pirataria de conteúdos de entretenimento cresceu 19% no mundo e 50% só no Brasil. E, mesmo que exista uma parte da sociedade que defenda a pirataria, alegando que ela “possibilita de fato a distribuição da cultura e do entretenimento”, essa prática, muitas vezes, está ligada a perigos como, por exemplo, instalação de malwares no computador, ou dispositivos móveis que buscam por senhas e logins para hackear contas bancárias e redes sociais. A eslovena companhia de segurança cibernética Eset, em 2020, identificou um vírus enviado por arquivos de download capazes de roubar dados dos usuários.
O combate das grandes empresas para tentar deter a prática ilegal é complexo, mas existem diversas práticas para reduzir ao máximo a divulgação de conteúdo de forma ilegal:
- A Amazon Prime Vídeo utiliza marca d’água em seus meta dados, onde, a partir disso, é possível o rastreio das informações do usuário que primeiro divulgou o material;
- Globo Play realiza vistorias constantes na web e em redes sociais, buscando e deletando conteúdo da empresa utilizados de forma não correspondente a seus direitos autorais;
- O Youtube trabalha de forma similar ao GloboPlay, porém verificando a própria plataforma em busca de conteúdos originais do Youtube ou de empresas parceiras, como a Warner Bros. Em alguns casos, o vídeo não pode ser postado na plataforma e pode até gerar a exclusão do usuário no site da plataforma.
São diversos os serviços de streamings disponíveis. No Brasil, mais de 10 plataformas originais estão entre as opções para assinantes e seus mais variados gostos. Além disso, a cada dia,surgem mais plataformas estrangeiras, como a mais recente, Disney+, que irá lançar mais um serviço no Brasil destinado ao público acima de 13 anos, o Star+. E também um dos maiores conglomerados de mídia, a Warner Media, chegou ao Brasil com o seu HBO Max.
Toda prática ilegal deve ser combatida. É importante, porém, parar para analisar o que leva à pirataria. A fragmentação de conteúdos de entretenimento tornou difícil para que um assalariado comum consiga manter, ao menos, um serviço disponível no mercado, logo, é questionável pensar que um cidadão que recebe um salário mínimo (atualmente R$1.100,00 reais) recorra a meios ilícitos para conseguir manter o equilíbrio mental necessário através de entretenimento.
Cotando os três principais fornecedores de conteúdo por transmissão de dados, em seus planos mensais mais acessíveis em 2021, temos: GloboPlay (22,90 no plano mensal), Netflix (21,99 no plano básico) e Amazon Prime Vídeo (9,90 no plano mensal).Ao todo, são R$ 55 reais mensais, utilizando as 3 plataformas.
Para o equilíbrio biopsicossocial e espiritual é necessário mais do que um trabalho e um teto. É importante a possibilidade de recorrer ao entretenimento, de conseguir se manter atualizado sobre notícias e documentários, em especial na situação pandemia que nos encontramos, onde as medidas de isolamento fazem com que passemos o maior tempo possível em casa. A pirataria de conteúdo é um crime, mas, que levanta, também, o questionamento social: como podemos transformar a cultura acessível a todos para que não haja a possibilidade de se recorrer ao ilícito?
Por João Pedro Carvalho
Coordenação: Eugenia Victal
Projeto de Extensão ComunicAção – Uninassau JP e Diário da Paraíba