Seis meses de covid-19: o que aprendemos com a pandemia?
Especialistas em comportamento preveem um futuro com maior conexão entre as pessoas, jornadas de trabalho mais curtas e o fim do supérfulo.
Após Seis meses desde o primeiro caso de covid-19 no mundo, especialistas em comportamento acreditam que a experiência deve mudar os padrões de relacionamentos amorosos, de trabalho e do modo de vida para muito além do uso de máscaras e do álcool em gel. Eles preveem um aumento de conexão entre as pessoas, jornadas mais curtas de trabalho e o fim do supérfulo.
Para a psicóloga Katree Zuanazzi, diretora do Instituto Brilhar Saúde e Mental de Curitiba, haverá uma mudança de valores. “A emergência da pandemia trouxe uma nova configuração de vida e mudou a forma de viver, pensar, agir e de escolher as prioridades em várias esferas da vida”, afirma.
Para ela, o pós-pandemia essas modificações vão se acentuar ainda mais. “Por ser um momento mais introspectivo, as pessoas perceberam seu posicionamento no mundo, analisando seu passado. Com esse distanciamento, vão conseguir enxergar o que era necessidade e o que era supérfluo”.
Já José Luiz Portella, doutor em história econômica pela USP e professor convidado da universidade, ressalta que a relação de trabalho passará por uma grande ruptura, pois, segundo ele, a quarentena fez muitas empresas perceberem que funcionários podem ser mais produtivos em menos horas trabalhadas em casa.
É o que reitera a diretora de Recursos Humanos da Baxter, Kelen Reis. “Vejo que as relações e modelos de trabalho, assim como as dinâmicas de líderes e liderados, viverão uma nova fase”, comenta. “O trabalho virtual exige dos líderes uma maior flexibilidade e sensibilidade para saber como acompanhar, dar suporte e encorajar à distância”, acrescenta Kelen, que ainda destaca a importância de fomentar uma conexão emocional e solidária com as pessoas e suas famílias.
A psicóloga acredita que os vínculos serão questionados. “Uma coisa que a gente percebeu é que muitos casais estavam juntos, mas o relacionamento só perdurava porque eles não se encontravam durante o dia, quase não se viam”, afirma.
Ela ressalta que a maior proximidade vai resultar tanto em desarmonias quanto no aprofundamento dos vínculos, dependendo do tipo de relacionamento.
Portella também acredita que tanto os conflitos ficarão ainda mais acirrados, quanto as relações harmônicas tendem a se fortalecer.
Katree enxerga que padrões de comportamento ganharão novos significados, como a relação que se tem com a própria casa. “Como estamos vivendo um trauma social, o inconsciente está registrando essa informação com muita dor. Mesmo que tudo passe, as pessoas vão viver uma vida se preparando para o caso de algo parecido ocorrer no futuro, então a tendência é que as pessoas busquem por casas mais confortáveis e invistam em vínculos afetivos”.
Na busca por esses vínculos e com a possiblidade de jornadas mais curtas, o que aumenta a proximidade com a família, Portella acredita haver uma tendência de que trabalhadores tenham jornadas mais curtas, abrindo espaço para que mais pessoas possam ser contratadas.
Mas nada disso virá de uma hora para outra, afirma. Para ele, essas mudanças irão ocorrer aos poucos. Segundo o professor, algo que contribui para isso é uma estrutura chamada “antagonismo formal”, que o país enfrenta historicamente. “Ela é quem faz com que o país nem decole nos melhores momentos nem imploda e atinja o fundo do poço nos piores”.
Para ele, esta estrutura tende a ser agravada pela pandemia, acarretando em uma ampliação da desigualdade: “Essa é a pior praga que existe no Brasil, é a coisa mais nociva que temos no país. E a covid-19 só a expôs”, finaliza.
Diário da Paraíba com R7